sábado, 6 de abril de 2019

Diálogo interno (1)

Diálogo interno que aconteceu imediatamente após encontrar alguns eleitores e defensores do fascismo atual governo que me cumprimentaram simpáticos, sorridentes e calorosos:

--Veja só como esses que você chama de "fascistas de merda" tratam você bem e cumprimentam você sorridentes e calorosos. E você com essa cara amarrada.

--Eu não ajudei a eleger um presidente que quer que eles sejam presos, torturados e/ou expulsos do país, se não forem mortos. Eles têm mesmo que me achar uma pessoa muito legal.

sábado, 1 de dezembro de 2018

A Sabedoria Suprema

Há uma lenda (que não sei se é legítima como tal, ou invenção de algum sujeito muito cínico-irônico) que diz o seguinte (a história parece ser de domínio público, essa versão é minha):

Houve, em algum momento da história humana, um grande mestre, muito sábio. Ao ser questionado, em público, sobre qual seria o segredo principal para a felicidade em nossa vida social, ele respondeu, calmamente:
"O segredo principal da felicidade é agir com sabedoria em nossas relações com as outras pessoas."
Isso, claro, não respondia nada e a pergunta seguinte era inevitável:
"E o que é agir com sabedoria em nossas relações com as outras pessoas?"
Sua resposta, dita lentamente, em tom calmo e com um sorriso, foi:
"Agir com sabedoria em nossas relações com as outras pessoas consiste em uma única regra, muito simples: 'Nunca entrar em discussão com idiotas'"
Isso gerou um burburinho entre os presentes, até que um pediu a palavra e disse:
"Não é possível que essa seja a regra principal para agir com sabedoria nossas relações com as outras pessoas!"
Ao que o mestre respondeu, sorrindo:
"Está certo, você tem toda a razão."

quinta-feira, 18 de maio de 2017

O bode começa a sair da sala.


Ontem à noite, foi o susto. Fomos todos surpreendidos pelas revelações bombásticas de gravações e filmagens que mostram, de modo inequívoco, que o atual presidente da república e o senador Aécio Neves (aquele que, de pirraça por ter perdido a eleição, fomentou o golpe contra o governo Dilma) participaram de em esquemas de propinas envolvendo a JBS, dona da Friboi. Isso no Jornal Nacional, com o William Bonner fazendo cara de reprovação ao citar Aécio Neves e a ato falho referindo-se a Michel Temer como "ex-presidente".

Hoje pela manhã, muita gente comemora que "a casa do Aécio caiu" e o fato quase inegável de que o governo Temer não deve durar muito. Na maioria dos casos, isso parece mais uma satisfação da "sede de justiça" (leia-se: "de vingança") do que da necessidade de justiça de verdade. Tampouco é a fragilização do golpe. Talvez seja o contrário.

É mais ou menos evidente que a Globo deve ter essas informações desde março ou abril e resolveu divulgar agora, da forma bombástica com que foram veiculadas no JN. Isso não significa que, de repente, a Globo ficou "boazinha", democrática e honesta. Se decidiram jogar Aécio do barco é porque a situação dele estava insustentável e poderia inviabilizar as alternativas de continuidade do golpe. Além disso, talvez agora haja alternativas mais viáveis, do ponto de vista de quem capitaneia o golpe.

Quanto a Temer, faz tempo que está fazendo hora extra. É surpreendente que tenha durado tanto, eu achava achei que ele seria apeado em fevereiro. Não resta dúvida de que já cumpriu sua função de bode na sala: foi ruim o suficiente para quase qualquer outro conservador com mais carisma e apelo à mídia parecer uma maravilha.

Para o golpe, é provável que Aécio e Temer tenham se tornado empecilhos, por motivos diferentes. Anulá-los dá espaço ao "novo". Quem seria "o novo"? Dória? Moro? Luciano Huck? Um intervalo tampão com FHC de volta? Talvez Nelson Jobim? A ministra Carmen Lúcia? Não faltam alternativas aos conservadores.

Não há motivos aparentes para pensar que o golpe deixará de seguir seu curso. Certamente terá, no futuro, uma "roupagem" mais aceitável. Parecerá menos mau, mas não será menos golpe. Continuará sendo uma reação conservadora à eleição de um programa progressista que priorizava avanços sociais e redução das desigualdades. Apenas por isso é golpe. Se Temer tivesse mantido, de alguma forma, o programa de governo eleito, poderia se dizer que não foi golpe, já que haveria continuidade do programa e das propostas eleitas nas urnas. Mas, claro, a deposição se deu também, ou especialmente, para impedir a continuidade do programa eleito nas urnas. Um golpe não pode ser nada além de um golpe.

O golpe, portanto, continuará. Este "golpe no golpe" não é um "contragolpe", são as mesmas pessoas que já apoiam golpe a dar continuidade a ele. Nada do que se viu, por exemplo, aumenta as chances de Lula não ser inviabilizado como candidato nas próximas eleições. Pelo contrário, a derrocada de Aécio e Temer favorece a continuidade do golpe por esvaziar bastante o discurso de que a Lava Jato e a mídia miram só no PT. Isso facilita, ainda que talvez só um pouco, a prisão de Lula. Já consigo imaginar coisas como "Agora que o Aécio foi, só falta ele" e outras frases cheias de efeito e vazias de sentido, como bordões de torcidas de futebol.

O fato é que, se Aécio e Temer forem efetivamente processados, não se poderá mais falar em justiça unilateral, apesar da fragilidade da acusação contra Lula em termos de provas materiais (para se dizer o mínimo). Afinal, na prática, não há notícia de nenhuma prova material que justifique sua condenação.
Por outro lado, o governo atual fica enfraquecido (e, com ele, momentaneamente, o golpe). Abre-se, então uma janela de oportunidade a para pressão por eleições diretas.

Se tivesse que fazer uma previsão, eu diria que tudo vai se precipitar muito rápido agora, para não dar tempo aos movimentos sociais e às ruas de conseguirem avanços significativos que anulem os efeitos (atuais e futuros) do golpe. Do lado progressista, de oposição ao golpe, a pressa deve ser ainda maior, porque todo mundo sabe que essa janela de oportunidade será breve. É improvável, mas não impossível, que tenhamos eleições diretas antes de 2018. Toda a mobilização pelo golpe e agora deste pós-golpe se dá no sentido de inviabilizar a candidatura de Lula e vai faltar tempo hábil para isso, se as eleições diretas forem imediatas.

Ainda assim, é um momento em que a pressão popular pode fazer toda a diferença. Uma oportunidade preciosa, única e limitada de, além de reverter o golpe, devolver à população a percepção do valor da participação política.

É importante considerar que o roteiro do golpe não mudou. Continua a aplicação da doutrina do choque, tudo acontecendo muito rápido para evitar que a resistência se organize e para manter a população em geral achando que "algo está sendo feito para resolver os problemas". Um momento oportuno para o aparecimento de um "Salvador da Pátria", mas, felizmente para o país, não parece haver nenhum candidato colorido à disposição. Pelo menos não maduro o suficiente, não faltam projetos, ainda verdes, de candidatos coloridos.

Os próximos dias serão tensos e, para quem gosta de thrillers políticos, eletrizantes. É pouco provável que, no curto e médio prazo, deixemos de ter um governo golpista. É, contudo, muito provável que, pelo menso até 2018, tenhamos um governo mais "simpático", mais "aceitável esteticamente", mas com o mesmo objetivo de barrar e reverter os avanços sociais dos governos eleitos entre 2002 e 2014.

Quem (sobre)viver, verá.

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Atualização em 18.mai.2017 às15:45

Acabo de saber que o Tico Santa Cruz previu parte dessa história há quase um ano:
https://www.brasildefato.com.br/2016/07/01/psdb-pode-estar-preparando-o-golpe-dos-golpes/

sexta-feira, 3 de março de 2017

Por favor, deixem todas as luzes acesas.

Imagem e créditos: https://pixabay.com/en/stained-glass-colorful-glass-1589648/  

Desde o segundo semestre de 2016, o mundo viu Donald Trump, o caricato e eterno candidato à presidência dos EUA ser eleito com um discurso racista, xenofóbico e assustador para quem acredita em direitos humanos para todos os seres humanos. Estamos também acompanhando o avanço da extrema direita na França e uma guinada conservadora no mundo em ergal ou, no mínimo, naquilo que os grandes meios de comunicação nos apresentam como "o mundo".

Ao mesmo tempo, que parece haver uma crise moral sem precedentes na nossa história (pelo menos na história recente do mundo ocidental ou do mundo mostrado pela mídia). Apenas para dar um exemplo fora do Brasil, uma assessora sênior do presidente dos EUA diz que uma dada declaração não foi mentira, mas uma referência a "fatos alternativos". Para usar uma expressão do José Simão: tucanizaram a mentira.

No Brasil, tivemos a consumação do golpe jurídico-midiático e, desde então, vemos um retrocesso inimaginável em termos de direitos sociais e trabalhistas. Acho que não exagero ao dizer que corremos o risco de voltar à era pré-Vargas. Avançam as privatizações, inclusive do pré-sal, que ia sustentar a educação do país. Boa parte do primeiro escalão do governo foi citada em delações sobre esquemas de corrupção. Ministros delatados são empossados, um indicado para o STF faz uma "sabatina informal" em um jantar em um iate junto com senadores que deveriam julgá-lo como apto ou não a ser empossado como Ministro na mais alta corte do país. Tudo isso, naturalmente, em nome do combate à corrupção.

Em muitos sentidos, o Brasil parece uma caricatura do mundo. Uma caricatura deveria ser algo que não existe, uma metáfora, não mais que isso. O Brasil, contudo, consegue este exagero, por um lado, no que há de mais ridículo, mais hipócrita, na mentira mais deslavada do escárnio a céu aberto. Conversas telefônicas gravadas ilegalmente são usadas como argumento para derrubar seu governo, mas conversas de um senador, em que ele diz, abertamente que se deveria fazer um golpe para "estancar a sangria" de uma operação contra a corrupção e menciona que o Ministro da suprema corte que é relator do caso "não conversa com ninguém" são tratadas como anedota, mesmo depois que o avião com o juiz citado cai.

Por outro lado, também somos caricatos na torpeza e maldade (sim, maldade pura e simples, independente das causas). O fenômeno pode ser mundial, mas aqui aceitamos o inaceitável como preço para evitar avanços sociais, mudanças no sentido de mais igualdade e jusitça. Ou seja, pagamos caro para manter os problemas que nos afundam cada vez mais.

As pessoas da assim chamada "ala progressita" criticam a visão dicotômica imposta por setores à direita, essa divisão entre "nós e eles". Ao mesmo tempo, como num espelho, muitos destes mesmos críticos usam esta mesma lógica em um discurso que talvez devesse ter uma forma diferente. Na prática, não sei se poderia ser diferente de todo. Talvez por alguma limitação cognitiva, tenho enorme dificuldade em "ver o que há de bom" em o povo se manter ou voltar à miséria, quem afirma que pobres não chegam à universidade pública "por falta de mérito próprio", quem deseja a manutenção e o aprofundamento do "escravagismo assalariado" moderno, para manutenção de um sistema que beneficia apenas alguns às custas de submeter milhões à miséria, á fome, etc. Olha para a história da humanidade e me pergunto se alguém com um mínimo senso ético, uma visão mínima de justiça social, poderia ter visto algo de "bom" no nazismo, no fascismo espanhol, ou mesmo nas ditaduras militar militares da América Latina, durante a guerra fria.

Não se trata, aqui, de uma batalha entre "os bons" (os "progressistas do bem") versus "os maus" (os "homens de bem", ou, mais precisamente, "de bens"). Somos todos humanos, com falhas e virtudes. Contudo, mesmo que o bem possa ser relativizado, o mal que nossa sociedade enfrenta hoje chega bem próximo da beira do absoluto. A luz pode ter muitas cores, mas as trevas não têm cor nenhuma, são a ausência de luz. Às vezes parece que marchamos céleres em direção às trevas éticas, à ausência generalizada de senso de coletividade em todos os níveis, enfim, à barbárie do "cada um por si", que é o fim da civilização.

A quem acha que a situação não pode piorar, sugiro um exercício lúdico que, tenho certeza, terá resultados surpreendentes: basta anotar o estado daquilo que acha que não pode piorar e a data de hoje em um papel e olhar daqui a, digamos, seis meses ou um ano.

Enfim, há luzes de muitas cores de muitos lados e, de um lado, há apenas escuridão. E estamos andando para ela.

Luzes coloridas permitem ver o mundo de muitas formas diferentes.

Por favor, deixem todas as luzes acessas.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Denegação



Momento triste da história do Brasil. Somos, neste momento, uma caricatura do mundo. Num mundo onde o Trump pode ser presidente do EUA, essa tarefa de ser caricatura não é fácil. Mas isso não é engraçado.


I
(EUA, mundo)
Orlando, Flórida. 49 pessoas são mortas e 53 ficam feridas em um nightclub. O atirador é morto pela polícia. O local era frequentado principalmente por gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, etc. O assassino se dizia chocado por ver homens se beijando na rua, tinha feito um voto ao Exército Islâmico, ao qual não aprecia pertencer, falando sobre gays. Foi uma boate gay, matou 49 pessoas gays e feriu mais 53. Mas isso não é homofobia. O fato de ele detestar gays não tem nda a ver com ele ir a uma boate gay e matar... gays.

II
(Rio de Janeiro, Brasil)
30 homens tem relações sexuais forçadas com uma menina desacordada ou semiconsciente, que protesta e pede que não a violem. Ela está em algo parecido com cárcere privado, é levada de um lugar para outro. Mas isso, 30 (trinta!) homens forçarem uma mulher privada de liberdade e não copletamente consciente a fazer sexo com eles não é estupro. Afinal, ela é da favela, não é virgem e deve ter provocado. Nada a ver com estupro, claro. Ela deve ter saído de casa pensando como faria para ser violentada por 30 homens inocentes no mesmo dia.

III
Claro que não existe cultura do estupro. Mulher estuprada é porque estava pedindo. As vítimas de estupro são responsáveis, porque provocam. Daí se conclui que os estupradores estão fazendo um favor a elas. O fato de que a maior parte dos estupros acontece dentro das famílias demonstra isso claramente.

IV
Uma presidente da República é afastada d cargo sem que haja sequer acusação de crime de responsabilidade contra ela. Algum tempo depois, vazam gravações de conversas telefônicas dos políticos que conspiraram para que ela fosse afastada, dizendo que ela não barrava investigações que os pejudicariam diretamente. COnversam sobre opções de como "parar essa sangria" e falam abertamente em afastá-la. Mas não, o afastamento não foi golpe.

V
(Brasília, Brasil)
O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, diz que não tem dinheiro nem contas no exterior. Confrontado com relatórios do Ministério Público Suíço mostrando contas e movimentações em seu nome, ele declara ser "apenas usufrutuário" do dinheiro. De onde o dinheiro veio e por que ele usa dinheiro que não é dele são perguntas que não são são feitas e para as quais provavelmente não haveria resposta. Ele é afastado da Câmara pelo STF, mas a votação de sua cassação por quebra de decoro parlamentar no conselho de ética fica praticamente empatada. Receber milhões de dólares em dinheiro na Suíça não é ter conta no exterior.

VI
O presidente interino Michel Temer monta um Ministério e um segundo escalão composto, em grande parte, por investigados, indiciados ou mesmo réus por crimes dos mais variados, incluindo crimes comuns, não ligados a nenhuma função pública. Mas é um governo honesto.

VII
O governo da Presidente afastada Dilma Rousseff não podia ter o ex-presidente Lula como ministro, porque ele era investigado na Lava Jato. A Presidente não é acusada de nenhum crime, nada pesa contra ela. Mas é uma presidente desonesta.

VIII
Jovens negros são assassinados todos os dias. A probabilidade de um negro sofrer morte violenta é muito mais alta que aquela de um branco sofrer morte violenta. Mas o país não é racista.

IX
A abordagem policial de moradores da periferia é truculenta, violenta e muitas vezes resulta em morte do abordado. A abordagem de pessoas brancas com aparẽncia burguesa é cortês. Nenhum branco com cara de burguês é morto pela polícia como resultado de abordagem. Mas não, a polícia não faz discriminação social nem racial.

X
Religiosos políticos e políticos religiosos discriminam e incentivam a violência contra homossexuais, bissexuais, gays, etc. Defendem que não existe homofobia, o problema é a cristofobia. Cristofobia existe, homofobia, não. Gays são mortos todos os dias em taxas muito mais altas que heterossexuais, mas isto acontece por acaso. O problema do país é a cristofobia.

XI
Morre muita gente de tiro, na guerra às drogas. Alguns também morrem de facadas. Poucos morrem de overdose. Mas é preciso recrudescer o combate às drogas, porque o problema são as drogas, que, diretamente, não matam quase ninguém. A guerra às drogas que é quase um genocídio não é um problema.

XII
O aborto clandestino mata milhares de mulheres todos os anos. A legalização do aborto evitaria estas mortes e permitiria inclusive reduzir o número de abortos, como aconteceu no Uruguay, onde metade das mulheres deixaram de fazer aborto depois de conversar com a equipe de saúde. Mas é preciso proibir o aborto até nos casos em que seria legalmente aceito. Assim, preserva-se a vida.

XIII
Mulheres pobres têm muito mais chances e morrer fazendo abortos clandestinos do que mulheres ricas que podem pagar clínicas caras e, supostamente, melhores. O mesmo com mulheres negras em relação às mulheres brancas. Mas a insistência na proibição do aborto não têm nenhuma discriminação social ou racial embutida.

XIV
Fazer aborto é um assassinato de um inocente que não pode se defender. Chacina na periferia, matando crianças, mulheres e homens adultos, tudo bem, porque se estavam lá, boa coisa não estavam fazendo. Ou seja, depois que se desenvolve, nasce e cresce, pode ser morto porque mora na periferia. Mas aborto é um crime muito pior. Não, não existe incoerência nisso.

XV
O Ministério do presidente interino Temer é composto apenas por homens, só há mulheres no segundo escalão. Mulheres podem, portanto, ocupar secretarias, mas não ministérios. Uma secretaria que se torna ministério recebe um ministro homem. Mas, não, o presidente interino Temer não é machista.

XVI
Uma sequência de governos que tirou milhões da fome e da miséria em 12 anos, que promoveu acesso à luz elétrica e saneamento básico, que promoveu acesso de pobres ao ensino superior foi uma sequência de governos em que nada se salva. Foi tudo muito, mas muito ruim mesmo.

XVII
Manter o pré-sal e a Petrobrás como patrimônio dos brasileiros é mau, muito mau, péssimo mesmo. Empresa pública só gera roubalheira. Entregar isso tudo para empresas estrangeiras é bom, porque daí não haverá mais roubos. Afinal, não podem nos roubar o que já entregamos de mão beijada.

XVIII
Se a tragédia ambiental da Samarco, que destruiu a cidade de Bento Rodrigues saiu da mídia e não se fala mais a respeito, não deve ter acontecido.

XIX
Cayman papers? Zelotes? HSBC? Swissleaks? Nada disso aconteceu, nem a Lava Jato que, depois de cumprir seu objetivo político, está para ser abortada. (Opa! mas aborto não era pecado? melhor dizer que "a Lava Jato será descontinuada".).

XX
Não houve mensalão tucano, não houve corrupção nas obras do metrô de São Paulo, não sabemos nada sobre desabamentos em obras do Metrô de SP, nem de viadutos em Belo Horizonte.

XXI
Alguns vazamentos de gravações de conversas telefônicas são bons, úteis, republicanos e estão dentro da normalidade. Mas só alguns, os outros são maus, ilegais e quase poderiam ser considerados atos terroristas.

XXII
(EUA, Mundo)
O problema dos Estados Unidos são os imigrantes, especialmente esses que professam uma religião e uma cultura diferentes do nativos. Outro problema são os índios.

XXIII
O Brasil está resolvendo seus problemas, não recebemos muitos imigrantes, nem muitos refugiados e estamos acabando com os índios.

XXIV
O porte de armas deveria ser liberado para todos, porque isso promove a paz. Só não podem ter armas os pobres, os negros, as feministas, os gays, os militantes de esquerda e a torcida do Corinthians.

XXV
Advogados não devem ter que respeitar o rodízio de veículos em São Paulo e devem ganhar autorização para porte de armas. Advogados salvam vidas.

XXVI
Mas o Samu deve ser extinto porque é um gasto desnecessário de recursos públicos.

XXVII
Intolerante é quem defende um governo eleito, quem defende programas sociais e quem defende que todos devem ter direitos iguais. Ao defender isso tudo, quem não aceita que se mandem os pobres de volta à miséria, é intolerante e está polarizando a discussão. (Isso deve ter a ver com a cristofobia.)

XXVIII
Desenvolve-se um discurso de que "não existem raças humanas". Mas até quem usa este discurso diferencia quem é negro de quem é branco apenas ao olhar para eles e diferencia também orientais de negros e brancos. Não existem raças, mas existe racismo.


E continua...

terça-feira, 31 de maio de 2016

O governo interino derruba um preconceito

O governo interino do Temer vem conseguindo, aparentemente sem esforço, derrubar um mito vigente desde o processo de abertura democrática, o que não deixa de ser um serviço prestado ao senso crítico geral.

Talvez isso venha de muito antes, mas pelo menos desde o final da ditadura militar e até recentemente, acreditava-se em um fenômeno mitológico chamado "A Eficiência da Direita", especialmente quando no governo. Esta forma de vida seria sustentada pelo que se costumava chamar de "O Consenso da Direita".

Hoje, vemos que o tal consenso se enquadra no rol de unaninimidades Nietzschianas, dentre as mais burras, aliás. Já a tal eficiência no governo... pode-se dizer que esta se mostra claramente nos quesitos "ministro desautorizado", "ministro desmoralizado", "ministro caindo" e "atitudes atabalhoadas" do que em qualqer outra coisa com consequências administrativas.

Não se trata, aqui, de questionar a legitimidade ou moralidade do governo interino. É perda de tempo insistir no óbvio. Mas derrubar preconceitos é sempre um bom serviço prestado.

Já é um motivo digno para este governo entrar para a história.

sexta-feira, 13 de maio de 2016

Entre hienas e lacerdistas, um Judas sem carisma

Os otimistas acham que Temer vai usar a máquina do Estado nas eleições de 2018 e que, mesmo que consigam tornar Lula inelegível, haverá alguém de esquerda (ou, no mínimo, de viés popular, como Ciro Gomes) que poderá concorrer com algum apoio e talvez alguma chance mas que não vai se eleger devido ao clima de terror criado com a repressão aos protestos pós-golpe. Eu gostaria muito de ser otimista.

Os realistas vêem a possibilidade de resistência ao governo espúrio (embora legalmente constituído) do Temer. A expectativa é de que os movimentos sociais vão se insuflar. Daí, em nome da "segurança nacional", o congresso mais conservador e mais sujo da nossa história recente aprova mecanismos de forte repressão. Claro, deixam-se válvulas de escape, porque é bom manter inimigos ativos, para poder dizer que a ameaça continua. Cria-se, assim, um clima de terror e a direita coxinha ganha as eleições de 2018.

Os pessimistas acham que, em "nome da democracia" e para evitar o "terrorismo", a repressão vai culminar com o cancelamento das eleições de 2018.

Tudo pode acontecer, claro, inclusive... nada. Mas independente do grau de otimismo de cada um, estamos diante de uma encruzilhada improvável entre 1954, 1964 e 1984.

Uma olhada rápida na nova lei "antiterrorismo", aprovada há alguns meses pode ser interessante, neste momento. Em nome do "antiterrorismo" e da suposta "segurança nacional" vale fazer qualquer forma de terrorismo de estado. Pode-se esperar algo muito parecido com um Estado de Exceção. Permanente, aliás, o que deveria gerar um paradoxo, mas não há paradoxos na nossa lógica política do "tudo pode quem ameaça, bate e prende". É como golpistas e elites costumam governar, especialmente quando há líderes com apoio popular que golpistas e elites não entendem, desconhecem e, naturalmente, temem.